2013-03-20

É a religião, estúpido.

Decidi me render aos temas correntes. A burocracia é chata demais e a vida é uma só. A pauta é Marco(s?) Feliciano e o papa. Na verdade, a pauta é religião: pra quem quer e pra quem não quer.

A eleição do papa lembrou a quem não estava prestando atenção que a principal seita cristã, com mais de um bilhão de membros mais ou menos ativos, tem princípios retrógrados e líderes homofóbicos e preconceituosos. Concedo que nem todos os católicos concordem com seu lider, mas deve ser uma minoria silenciosa. Ou que se diz parcialmente católica. Ou que não leva a coisa toda muito a sério, exceto pela crença no designer supremo e um gosto compatilhado dos eventos sociais (particularmente difíceis de serem suportados sem comida ou álcool por ateus). São todas opções melhores que catolicismo pleno. Ainda assim, inferindo pelo tempo de TV e volume de notícias da última semana, muita gente se importa o bastante com escolha do líder que se diz infalível.

Já o líder de outra seita, o pastor Feliciano, vem sendo notícia por ser assumidamente homofóbico e preconceituoso. Na verdade, ninguém se importaria muito se ele não tivesse sido eleito presidente de uma comissão parlamentar que trata da defesa de minorias e direitos humanos. Como não é o líder máximo de uma seita tão poderosa como a católica, poucos se arriscam a defendê-lo publicamente. Ou talvez seja porque não usa cetro e capa, difícil ter certeza.

Os que não se sentem representados pelo papa Francisco ou pelo pastor Feliciano desviam o foco do problema: o filho do hômi não faria assim, que eles não são verdadeiros cristãos, que as seitas estão todas corrompidas e distantes da verdade divina, que o manual está sendo interpretado incorretamente, blablabla. É um interessante jogo de imaginação: o que JC realmente faria, como seriam esses cristãos puro sangue, como seria a mais pura das seitas, e se interpretassem o manual corretamente (boa sorte). Não por acaso, esse momento perfeito parece ter acontecido unicamente há dois milênios, e ainda assim assumindo que o manual está factualmente correto. Depois desse momento mágico, conquistas sangrentas, imposição da fé, torturas, execução na fogueira, pedofilia e discriminação foram algumas das ações praticadas, apoiadas, protegidas  ou acobertadas por líderes católicos. Já as outras seitas não têm uma história tão maculada e há até algumas que não tem nenhum problema se os fiéis ou pastores forem gays. A Wikipedia tem uma lista de denominações LGBT friendly.

Mas seriam, no fundo, tão diferentes? Os princípios são similares: crença num ser sobrenatural e que rege (caprichosamente) o universo, código moral rígido, fé. Com esses princípios e um manual escrito e remendado por séculos (e que se publicado hoje venderia menos que um jornal de segunda-feira), todo o tipo de preconceito e violência podem ser justificados. Ou condenados. Como saber quem está certo? Por sorte, as sociedades modernas conquistaram aos poucos o estado laico e adotam uma moralidade guiada por instinto (só um pouco), justiça social, compreensão do mundo natural. Rejeitar ou esquecer que existe um Capo di tutti capi pode não ser confortável para a maioria. Mas esse conforto tem sido o preço de eleger o Feliciano e legitimar o papa.

Alto demais.

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