2012-07-18

Parar ou não parar?

O óbvio ululante: a opinião a seguir é estritamente pessoal.

Tempo de paralisação e greve em Brasília e na CAPES. Como nunca fui o tipo engajado, sindicalista ou esquerdista típico eu sempre debato com colegas e tento achar justificativas para paralisar por um dia ou não. Meu gut feeling é que a greve tradicional é pouco eficiente. Mas é preciso pensar o porquê, claro.

Paralisar é, em tese, uma maneira de pressionar o empregador, no caso, a administração federal que representa o contribuinte. Tenta-se mostrar que sua atividade é importante, sua mão-de-obra essencial e que, por isso, o seu trabalho merece uma remuneração melhor. A pressão serve, essencialmente, para ser notado pela administração e, principalmente, pelo público para quem você presta os serviços. Ganhar força na negociação política. Professores de universidade federais param de dar aula e milhões de estudantes não têm aula, policiais entram em greve e a população se sente insegura (na melhor das hipóteses), motoristas de ônibus param e parte da população não vai trabalhar ou estudar. E o patrão, governo ou empresa, fica mal na fita com o eleitor ou o cliente.

E se um órgão de fomento como a CAPES pára por um dia? Quem se incomoda? Quase ninguém. Ofereço três motivos para tentar explicar o porquê:

1. Parte do trabalho não é tão imediata que o atraso de um dia não possa ser compensado depois;
2. Há um número grande de servidores em cargos comissionados que não param;
3. Parte da força de trabalho nas áreas técnicas (vou chutar 20%) é de trabalhadores terceirizados.

Seria possível, talvez, superar ou minimizar esses empecilhos e ter uma greve ou paralisação eficiente? Se a opção para lutar por um melhor salário for paralisar as atividades, será necessário parar de se iludir que marchas, cartazes e foguetes na janela do ministro são suficientes para se conseguir um aumento salarial.

O primeiro motivo é provavelmente o mais fácil de contornar. Se a paralisação é de um dia, esse dia tem de contar. Bastante. Excluindo a possibilidade de atrasar o pagamento de bolsistas que dependem da bolsa para viver, o dia escolhido para uma paralisação precisa ser um que cause incômodo às instituições, pesquisadores importantes, dirigentes de universidades. Uma ação que tenha possibilidade de ser percebida por alguém de fora do órgão. Uma ação que seja vista como causada pela paralisação e não atribuída à morosidade habitual de um órgão público.

Já o segundo motivo é mais um fato a ser minimizado. Os ocupantes de cargos comissionados, além do dinheiro extra, têm, parcialmente, a responsabilidade de executar as ações de seu setor dentro do prazo, da normalidade, da forma mais eficiente possível. Receio de exoneração e senso de responsabilidade são convincentes o suficiente para fazer com que não parem. Como há, aproximadamente, um cargo comissionado para quatro servidores, 25% dos servidores, no mínimo, não deve aderir à uma paralisação. Ainda que não consigam compensar a força de trabalho dos que paralisaram as atividades, esses 25% servem para dar uma aparência de normalidade e diminuir o número dos que param. Essa aparência de normalidade é amplificada pelo terceiro motivo: a existência de servidores terceirizados para executar atividades técnicas que deveriam ser executados por servidores da carreira de Ciência e Tecnologia.

Este último motivo talvez seja o mais difícil de enfrentar. Mesmo com um quadro de servidores maior que no passado e pressão do poder judiciário para que postos de trabalhos terceirizados irregulares sejam eliminados, trabalhadores terceirizados são a regra na CAPES. Não é nem possível tentar dizer "não é bem assim". Há trabalhadores terceirizados em quase todos os setores. Muitos têm acesso a sistemas internos, incluindo de pagamento, emails corporativos, documentos com informações bancárias de terceiros, bases de dados internas. Em alguns casos, chegam a serem os responsáveis imediatos por vários programas da instituição. Somados aos servidores com cargo comissionado, tem-se uns 40-50% da força de trabalho que não irá parar as atividades. E estes terceirizados, por terem acesso e atribuições semelhantes a dos servidores, podem resolver ou minimizar problemas surgidos com a ausência dos que paralisaram e frustrar a conseqüência desejada da paralisação.

Essa situação de servidores terceirizados que não fazem greve, não entram em confronto e não questionam (em todos os casos porque não podem) sugere ao patrão uma obviedade: "aumento pra quê se funciona (quase) igual sem os camaradas que ganham mais e que podem fazer greve?" Sem considerar teorias da conspiração, a ausência de diferença entre ter servidores de carreira ou terceirizados facilmente substituíveis é o que importaria numa decisão racional sobre qual o salário mínimo possível que é possível pagar ao servidor de carreira. Professores substitutos não mantêm universidades funcionando, policiais não têm substitutos e novos motoristas de ônibus não são treinados rapidamente.

E justamente para essa situação mais difícil é que o servidor de carreira vai ter de parar de esperar e fazer sua parte. Na gíria do futebol: matar no peito, pedir a bola, chamar a responsabilidade pra si. Assumir seu papel de analista/assistente e exigir tarefas de acordo com a responsabilidade do cargo. Parar de aceitar o mais cômodo, o menos confrontacional. Lembrar aos dirigentes (na maioria colegas de carreira) que é obrigação dele não jogar dinheiro fora deixando que servidores com maior salário exerçam as mesmas funções de funcionários temporários de apoio administrativo. Valorizar o seu trabalho, o seu mérito, o seu cargo, o dinheiro do contribuinte, a sua carreira.

No fim, vale a pena paralisar com as condições atuais? Minha resposta, a partir de hoje (ontem paralisei), é provavelmente não. Paralisar não vai incomodar ninguém, não vai paralisar nada de fato, não vai sair nem no jornal local gratuito. Será um apego à uma tradição que parece não ter as condições necessárias pra funcionar. As possibilidades na luta por um salário melhor são melhorar essas condições ou achar alternativas de pressão.