2013-04-15

As ruas têm cheiro de gasolina e óleo diesel

Do tempo em que engarrafamento era notícia.

"Acho lindo um engarrafamento!", é a declaração de Graça Foster, presidente da Petrobras, que promete indignar parte da imprensa esta semana. A entrevista era sobre a Petrobras e assuntos relacionados, mas como perder uma manchete que pode gerar uma pseudo-polêmica? O contexto? Enterra lá no final da matéria.

Se Foster adora um engarrafamento porque é sinal que a Petrobras está indo bem, eu adoro porque é um dos sinais visíveis que o Brasil mudou. Se para Foster o engarrafamento é o lucro da Petrobras, para mim é a menor desigualdade social. Com mais renda disponível, inflação baixa e juros pagáveis, ainda que altos, quem pôde fez o esforço e parou de andar de ônibus. Mesmo sem ar condicionado, vidro elétrico ou direção hidráulica, o carro próprio supera o ônibus abarrotado, lento, perigoso. Mesmo com o custo alto da gasolina, do seguro, dos impostos, o carro se tornou uma possibilidade. O desejo pôde ser saciado. Trânsito lento iria fazer alguém voltar a andar de ônibus? Sem chance. Foda-se o trânsito.

Os ricos e a ex-classe média reclamaram pelo canto da boca dos carros financiados em 72 meses, mas tiveram de engolir o engarrafamento realmente democratizado. Podem zombar dos carros populares sem potência para arrancar e fazer o barulho dos carros caros, mas quem precisa de potência no engarrafamento de 20 km/h? SUVs fálicas ou Corsas 1.0 compartilham o mesmo espaço e estão sujeitos às mesmas leis. O engarrafamento no Brasil tornou-se o maior nivelador social do espaço urbano.

O mercado fez o que foi possível para livrar a classe alta e média alta da invasão social: bairro diferenciado, agência de banco diferenciada, supermercado diferenciado, shopping diferenciado, sala de cinema diferenciada, plano de saúde diferenciado, seguro de carro diferenciado, escola diferenciada. Mas o trânsito é indiferente à classe social: égalité na marra.

Seria uma justiça social cruel? Afinal, a nova classe média também sofre com a situação. Mais até, quando não há ar condicionado. Poderia haver uma solução boa para todos? "Transporte público decente?", suspiram os idealistas. Talvez, mas de que adianta discutir o que, no Brasil, não vai acontecer? Seja ônibus, metrô, trem urbano, bicicleta, nenhum governo dá qualquer pelota para o transporte público ou alternativo. Seria uma discussão fútil. Talvez só seja possível quando for desfeita a estabelecida e perversa relação "público -> para pobre/ruim". Trabalho para mais de uma geração. Mais realista é torcer/lutar para que não adotem no Brasil o engarrafamento diferenciado. "Estou só esperando o que vai acontecer..."

Um comentário:

  1. Agora é francês?
    O blog de égalité nao tem nada..hehe

    Essa do transito foi um um soco no estomago da classe alta... bravo!

    ResponderExcluir