2012-03-15

A reterceirização da CAPES: "There is hope, but not for us"

Para terminar a série sobre a terceirização da CAPES, uma tabela e um não-tão-curto blablablá serão suficientes (espero). A tabela mostra os salários iniciais da carreira de Auxiliar e Assistente em Ciência e Tecnologia atuais e os salários mínimos (na prática, muito provavelmente serão os salários reais) estipulados no edital (modificado hoje) de terceirização da CAPES e CNPq . Os salários não representam o custo total do trabalhador para o contribuinte.


Categoria Salário bruto (R$)
Auxiliar em C&T                1.890,37
Assistente em C&T                3.163,28
Auxiliar Administrativo - I                   669,66
Auxiliar Administrativo - II                1.416,77
Auxiliar Administrativo - III                2.453,85

A tabela pode assustar os não-burocratas com os salários: um emprego público com exigência de nível médio com salário (inicial) de mais de 3 mil reais! Mas não é tão absurdo para Brasília, que é tão cara quanto Rio ou São Paulo e tem várias carreira públicas com salários melhores. Os cargos de Auxiliar Administrativo também tem salários razoáveis, não exagerados. Mesmo os salários brutos sendo menores, o custo efetivo da administração acaba sendo bem maior, às vezes o dobro, porque não estão incluídos os impostos, férias, 13o, custo da substituição do posto de trabalho, lucro da empresa. Também o custo do servidor de carreira não é apenas o seu salário: INSS, aposentadoria, licenças prolongadas com vencimentos integrais, adicionais conquistados na juustiça, adicionais por cargos comissionados, rotatividade dos servidores. Certamente o custo do Auxiliar Administrativo I é menor que o do Auxiliar em C&T, mas esses são apenas 5% dos cargos do edital. Para a quase totalidade, a diferença não será suficiente para causar rombos ou aliviar as contas do governo.

Com custos similares, surge a dúvida: seria melhor terceirizar apoio administrativo para que os servidores se concentrem em outras tarefas? Ou manter as atividades de apoio administrativo como privativas dos servidores de carreira?

É possível que sim, mas nem a Lei da Carreira de C&T nem a legislação atual sobre terceirização no Executivo Federal permitem atualmente. Essa vedação seria, então, um anacronismo da legislação? Não necessariamente. Já mostrei num post anterior que outras carreiras incluem apoio administrativo na lista de atividades a serem desempenhadas por servidores de carreira. Provavelmente não por acaso: o que se está chamando de apoio administrativo inclui a manipulação de informações por vezes sigilosas como CPF de terceiros, informações bancárias, identidade de pareceristas anônimos, informações sobre processos de tomada de conta e informações médicas de servidores.
 
Claro, não há, a priori, como afirmar que a informação sigilosa está mais protegida se manipulada apenas por servidores. Pode-se, no entanto, assumir que o servidor de carreira tem mais a perder se cometer uma falta deste tipo: além de sanções cíveis e penais, sua carreira como servidor público será afetada. E pode-se também assumir que um servidor público quer uma carreira sem problemas. Quer a estabilidade, a chance de ir para uma carreira melhor, de assumir cargos comissionados e uma aposentadoria integral (ou quase).

Por fim, minha última suposição é de que o servidor de carreira que se importa minimamente com o que faz quer respeito ao seu trabalho, tanto o interessante quanto o entediante. Perceber que pode ser substituído por funcionários que não demonstraram competência prévia (o concurso público) para desempenhar funções similares à sua é frustrante, desestimulante, desrespeitoso.

Presenciar toda essa situação continuar inalterada (e indiscutida) é que me fez lembrar da frase atribuída à Kafka: "There is hope, but not for us."

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