2012-04-17

Tem vaga na sombra?

Um assunto um tanto chato, mas polêmico, surgiu para dissonância: o número insuficiente de vagas na garagem do edifício da CAPES em Brasília. Não surpreendentemente, e como em quase qualquer prédio comercial em Brasília, há um número de vagas bastante inferior ao número de funcionários. A solução adotada foi reservar uma parcela das vagas a partir de critérios nada populares.

Essencialmente, há vagas para todos os servidores com cargos comissionados, para os que trabalham no gabinete da presidência, gestantes (se pedirem), portadores de necessidades especiais e umas poucas vagas para visitantes. As vagas que sobram, e que têm pior localização, são ocupadas por quem chegar primeiro. No final das contas, a maioria acaba estacionando no terreno vazio ao lado do prédio ou nas redondezas e pega sol na cabeça e barro no sapato antes de entrar no prédio.

Fonte: Boa e velha Wikipedia. Verbete: Parking lot.
Os que têm vaga garantida geralmente não querem perder o direito/privilégio e os que não têm vaga querem novos critérios que os incluam. Não há solução mágica nem que agrade à maioria. A atual é tolerada, mas o aumento de vagas reservadas com cargos recém criados, e conseqüente diminuição das vagas para a massa de sem-vaga-na-sombra, faz voltar a insatisfação. Seria hora, então, de rediscutir os critérios ou de fingir que a solução atual está boa? Exceto para os dinossauros que vêem o emprego público como garantidor de privilégios, uma nova distribuição de vagas na garagem deveria levar em conta o interesse da instituição e do bem estar dos seus servidores, o que não é claramente correlacionado com a nomeação para um cargo comissionado.

Claro, aí é que o bicho pega. Que diabos é o interesse da instituição? Uma maneira de analisar o interesse de um órgão público é sempre seguir o dinheiro. Essa é, implicitamente, a justificativa de haver vaga na garagem para servidores com cargo comissionado. A hora de trabalho é mais cara para o contribuinte e um estacionamento mais fácil minimiza o tempo gasto para estacionar. Menos tempo estacionando é mais tempo trabalhando para o contribuinte. No outro oposto, quanto menor a gratificação, menor a necessidade da vaga fácil. O que complica é onde colocar a linha da vaga garantida, qual o nível da gratificação mínimo para garantir a vaga?

Além do critério econômico, critérios de bem estar e legais precisam entrar também. Além de portadores de necessidades especiais, servidores com mais de 65 anos (ou 60) e gestantes poderiam ter a vaga garantida. Não são um grande número: todo mundo quer se aposentar da burocracia logo e ter filho em Brasília é para os de coragem (custo).

Os critérios de bem estar são mais palatáveis, mas o econômico não deixa de parecer cruel e de privilégio. Aí o que se precisa tentar separar é a função pública do status que se dá a esse funcionário com cargo comissionado. A função é uma maior responsabilidade de administração do patrimônio público. O maior salário é um estímulo, fator de atração e uma compensação para esses servidores. O suposto status é um resquício de tradições patriarcais que custam a acabar, mas que não estão se tornando obsoletas no mundo moderno. Basta lembrar do vídeo dos deputados suecos que têm um apartamento funcional minúsculo e lavam sua própria louça. Ou, no Brasil,... xapralá. Não vou encontrar nada remotamente similar.

Ainda não convencido do critério econômico? Nem eu. O gosto amargo de alguns terem vaga porque foram indicados a um cargo não sai fácil. Deve ser porque estamos numa burocracia em que há secretárias que tratam de assuntos particulares de chefes e servem café. Em que existem pessoas para apertar o botão do elevador para outras. Em que ministros usam funcionários públicos como motorista particular da esposa. Em que cargos dependem apenas de indicação e, raramente, dependem de mérito por critérios explícitos. Em que há uma estabilidade que protege o servidor improdutivo e não estimula o produtivo. Enfim, uma longa tradição de privilégios, corrupção, injustiça. Nesse contexto todo, a vaga garantida na sombra é o que diz em inglês a expressão add insult to injury.


3 comentários:

  1. Peguemos pegar este viés econômico que você citou. Há um sem número de vagas destinados aos Iluminados e aqueles que tem que correr pela manhã para evitar o trânsito que realmente cheguem muito cedo para garantir sua vaguinha cada vez mais rara, mas este acúmulo de vagas do tipo DAS não estão necessáriamente ocupadas durante todo o dia ficando então ociosas estas vagas. Num setor onde as vagas cogertas e seguras são raras ou mesmo impossíveis quanto não valeriam estas vagas ociosas? Não seria este um caso de desperdício flagrante? Porque não ter vagas rotativas para os Iluminados? Ou eles trabalham todos os dias do ano sem férias, sem licenças, sem reuniões externas, sem viagens?

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  2. Sim, Sísifo. A distribuição atual de vagas reservadas é burra. Prever uma ocupação de 100% num universo de mais de 100 pessoas, muitas delas com viagens frequentes, é desnecessário. Não seria difícil estimar quantas vagas ficam geralmente livres, por qualquer motivo que seja. Que alguém vá se dar a esse trabalho é uma outra conversa.

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  3. A pesquisa já está em andamento. Aguardem!

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